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A ciência não descobriu como curar a doença, mas tem conquistado avanços para melhor enfrentar esse tipo de demência.
Celebrado em 21 de setembro, o Dia Mundial do Alzheimer é uma campanha idealizada pela Alzheimer’s Disease International (ADI) para conscientizar a população sobre essa doença neurológica degenerativa altamente prevalente entre os mais velhos, caracterizada por danos nas funções cerebrais, como perda de memória, linguagem, cognição e capacidade do autocuidado. Só no Brasil existem 1,2 milhão de portadores da doença, a maior parte deles ainda sem diagnóstico, segundo o Ministério da Saúde. No mundo, são cerca de 35,6 milhões de pessoas.
Mantendo o tema do ano anterior – “Conheça a demência, conheça a doença de Alzheimer”, a campanha desde ano também é uma oportunidade para informar que, apesar de ainda não haver cura para essa que é a mais comum dentre todas as demências, a ciência tem avançado cada vez mais nessa direção, aumentando o conhecimento sobre os mecanismos da doença, apontando para possíveis novas alternativas de tratamento e desenvolvendo métodos diagnósticos mais eficazes.
Para saber mais sobre o Alzheimer e o que há de novo, conversamos com o Dr. Hennan Salzedas Teixeira, neurologista clínico da BP.
Existem muitas hipóteses sobre o mecanismo da doença de Alzheimer. Cientistas já sabem que o aparecimento da enfermidade está associado ao acúmulo de uma proteína, a beta-amiloide, em partes específicas do cérebro, cuja toxicidade acaba resultando na morte dos neurônios, as células do cérebro. Não se sabe ao certo o que provoca esse fenômeno, mas cientistas estão tentando descobrir a influência de vários fatores, como a resistência à insulina, o aumento do cortisol (um tipo de hormônio) e defeitos celulares, inclusive genéticos, que explicariam a incapacidade de degradação dessa proteína.
A doença de Alzheimer tem diversas formas de apresentação, dependendo sempre das regiões do cérebro que são afetadas pela enfermidade. Geralmente, começa com esquecimentos, principalmente dos fatos mais recentes, enquanto as memórias mais antigas permanecem inicialmente preservadas. São comuns os relatos de pessoas que se queixam de não se lembrar de palavras com a mesma facilidade das fases anteriores da vida, que passam a não recordar onde guardaram as coisas, esquecer o fogão ligado ou as portas abertas. Também podem ser observados falta de motivação e depressão e, em alguns casos, sinais de agressividade.
Progressivamente, o indivíduo vai perdendo a capacidade do autocuidado e de gerir sua vida prática, como cuidar das suas finanças ou fazer as compras. À medida que a doença avança, o paciente torna-se dependente do cuidado de terceiros.
Nas fases mais avançadas da doença, os prejuízos de memória se agravam, implicando extrema dificuldade de registro de dados recentes e até dificuldade para acessar informações antigas, afetando inclusive o reconhecimento de ambientes, parentes e pessoas queridas. Podem ocorrer também dificuldade de engolir alimentos, incontinência urinária e fecal e acirramento das mudanças de comportamento. Problemas motores podem levar os pacientes à cadeira de rodas ou à cama, local onde muitos passam o resto da vida desconectados do mundo.
A história clínica do paciente é a base para diagnosticar a doença, com atenção para dois principais aspectos combinados: perda de memória de fatos recentes associada a outras perdas cognitivas, como alterações na capacidade de a pessoa se localizar no espaço, déficit de linguagem ou incapacidades de desempenhar tarefas cotidianas (manejo do dinheiro, administração de remédios, fazer compras, etc.). Um fator preponderante observado é o grau de dependência de terceiros. Quando o paciente perde sua independência, o diagnóstico muda de quadro de declínio cognitivo leve para demência.
Apesar de ser a mais prevalente, existem outros tipos de demências, como a Doença de Lewy e as demências frontotemporal e vascular, entre outras. Algumas manifestações do Alzheimer podem ser bem parecidas com outras demências, como uma variante que é muito semelhante com a demência frontotemporal. Para distingui-la, levamos em consideração a forma como a doença se apresenta e empregamos outros métodos para refinar o diagnóstico.
Exame de sangue e de imagem são solicitados para afastar outras causas de declínio cognitivo. Por meio de exame de sangue é possível ter certeza de que o problema do paciente não está relacionado a hipotireoidismo, anemia, alterações hepáticas ou distúrbios hidroeletrolíticos, principalmente alterações nos níveis de sódio. A sorologia é um exame solicitado para afastar a possibilidade de quadros infecciosos que mimetizam a doença de Alzheimer, como os provocados pela sífilis e pelo HIV. Esses exames são cruciais em pacientes com menos de 50 anos.
Exames de imagem servem para afastar a possibilidade de tumores e derrame. No entanto, é importante destacar que, apesar de exames de imagem poderem trazer achados sugestivos, como atrofias em regiões do cérebro, ressonâncias magnéticas e tomografias completamente normais não afastam o diagnóstico da doença de Alzheimer.
Apesar de não haver cura, o diagnóstico precoce permite acelerar o início do tratamento, que visa retardar a progressão da doença. Além disso, familiares e cuidadores já podem ir sendo preparados técnica e emocionalmente para cuidar do paciente, adquirindo habilidades para manejar as possíveis situações com as quais terão de lidar com o desenvolvimento da enfermidade.
O tratamento é medicamentoso, baseado em três tipos de inibidores acetilcolinesterase. Trata-se de enzimas que visam inibir a degradação de um neurotransmissor chamado acetilcolina, visando melhorar a cognição. Uma dessas três opções de remédios é indicada para pacientes em fase leve do Alzheimer. Se uma não funciona, outra é indicada. Quando o paciente evolui para fases mais adiantadas, pode ser prescrito junto outro tipo de remédio: a memantina, substância que regula o glutamato, outro tipo de neurotransmissor.
Se o paciente não toma os remédios regularmente conforme a prescrição, além de não garantir os benefícios que poderiam trazer, podem passar a produzir efeitos colaterais, como sonolência, confusão mental e alterações no fígado. É preferível que a pessoa não tome remédios para o Alzheimer do que consumi-los de forma irregular e inconstante.
Pesquisas ainda avaliam a eficácia de anticorpos monoclonais (proteínas sintetizadas em laboratório) desenvolvidos para tentar degradar a beta-amiloide, a proteína que se acumula no cérebro provocando danos cognitivos. Essa solução teria um impacto positivo especialmente nos pacientes diagnosticados precocemente. Contudo, ainda há controvérsias entre os especialistas, e novos estudos são necessários para avaliar a pertinência desse tipo de tratamento.
No campo diagnóstico, o avanço se deu por meio de exame de imagem (PET-CT) que permite identificar o acúmulo da proteína beta-amiloide no cérebro mediante o uso de um radiofármaco (Florbetabeno-18F). Com esse recurso, que fornece uma espécie de mapa da presença da doença dentro do cérebro do paciente, os especialistas ganharam um método que permite diagnosticar o Alzheimer diretamente e não mais por exclusão de outras doenças, como era até então.
É importante que os pacientes possam contar com centros de referência como a BP, onde terão apoio de neurologistas especializados para o pronto diagnóstico e tratamento mais adequado e efetivo.
Além de neurologistas, que são os profissionais habilitados para interpretar e intervir sobre tipos de manifestações do Alzheimer que podem colocar o paciente e seus familiares em risco, centros de referência têm uma estrutura multiprofissional, essencial para o enfrentamento dessa doença. Os geriatras, por exemplo, podem ajudar no gerenciamento da saúde dos pacientes, que precisam sempre manter sob controle outros fatores associados ao Alzheimer, como diabetes e hipertensão, esta última também beneficiada com a expertise dos cardiologistas. Psiquiatras muitas vezes podem interferir em quadros psicóticos. Outros especialistas podem ser acionados mediante outras comorbidades.
Estudos indicam que quanto mais tempo de vida a pessoa dedicar aos estudos e à leitura menor é a chance de desenvolver a doença e, caso ela ocorra, tende a ser menos grave. A explicação é que atividades intelectuais produziriam mais redes neuronais, o que os especialistas chamam de reserva neurológica. Recomenda-se também uma vida mais ativa e alimentação saudável para evitar ou retardar o declínio cognitivo, e controle do diabetes e da hipertensão.